domingo, 29 de junho de 2008

Por Luís de Camões...


Aquela cativa, que me tem cativo,
porque nela vivo, já não quer que viva.
Eu nunca vi rosa, que em suaves molhos,
que para meus olhos, fosse mais fermosa.
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Nem no campo flores, nem no céu estrelas,
me parecem belas, como os meus amores.
Rosto singular, olhos sossegados,
pretos e cansados, mas não de matar.
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üa graça viva, que neles lhe mora,
para ser senhora, de quem é cativa.
Pretos os cabelos, onde o povo vão
perde opinião, que os louros são belos.
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Pretidão de Amor, tão doce a figura,
que a neve lhe jura, que trocara a cor.
Leda mansidão, que o siso acompanha:
bem parece estranha, mas bárbara não.
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Presença serena, que a tormenta amansa:
nela enfim descansa, toda a minha pena.
Esta é a cativa, que me tem cativo,
e, pois nela vivo, é força que viva.
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sábado, 28 de junho de 2008

Soneto da Saudade - Guimarães Rosa


Quando sentires a saudade retroar
Fecha os teus olhos e verás o meu sorriso.
E ternamente te direi a sussurrar:
O nosso amor a cada instante está mais vivo!
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Quem sabe ainda vibrará em teus ouvidos
Uma voz macia a recitar muitos poemas...
E a te expressar que este amor em nós ungido
Suportará toda distância sem problemas...
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Quiçá, teus lábios sentirão um beijo leve -
Como uma pluma a flutuar por sobre a neve,
Como uma gota de orvalho indo ao chão.
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Lembrar-te-ás toda a ternura que expressamos,
Sempre que juntos, a emoção que partilhamos...
Nem a distância apaga a chama da paixão.
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sexta-feira, 27 de junho de 2008

Alma Partida - Afonso Estebanez Stael


Eu tenho a alma partida
por duendes da loucura
por causa da despedida
entre o amor e a ternura...
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Loucura de amor jurado
pela jura não cumprida
do lado compromissado
da ternura prometida...
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De súbito foi o instante
em que tudo se perdeu...
Mas era tempo bastante
de viver o que morreu...
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E tudo o que era presente
foi tempo tão esquecido
que a ternura impaciente
não viveu o amor perdido...
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E assim a alma partida
por duendes da loucura
ser causa da despedida
entre o amor e a ternura...
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quinta-feira, 26 de junho de 2008

Donna mi Pregas - Paulo Leminski


Se o amor é troca
ou entrega louca
discutem os sábios
entre os pequenos
e os grandes lábios
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no primeiro caso
onde começa o acaso
e onde acaba o propósito
se tudo o que fazemos
é menos que amor
mas ainda não é ódio?
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a tese segunda
evapora em pergunta
que entrega é tão louca
que toda espera é pouca?
qual dos cinco mil sentidos
está livre de mal-entendidos?
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quarta-feira, 25 de junho de 2008

Por J. G. de Araújo Jorge


"Não tens culpa se este amor nasceu como uma planta humilde e ignorada,
que ninguém plantou, mas que vive e que cresce,
e afinal em meu peito criou fundas raízes
e todo em flores azuis de sonho se enfloresce (...)"
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terça-feira, 24 de junho de 2008

Crônica do Amor - Arnaldo Jabor


Ninguém ama outra pessoa pelas qualidades que ela tem, caso contrário os honestos, simpáticos e não fumantes teriam uma fila de pretendentes batendo a porta.
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O amor não é chegado a fazer contas, não obedece à razão. O verdadeiro amor acontece por empatia, por magnetismo, por conjunção estelar.
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Ninguém ama outra pessoa porque ela é educada, veste-se bem e é fã do Caetano. Isso são só referenciais.
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Ama-se pelo cheiro, pelo mistério, pela paz que o outro lhe dá, ou pelo tormento que provoca.
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Ama-se pelo tom de voz, pela maneira que os olhos piscam, pela fragilidade que se revela quando menos se espera.
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Você ama aquela petulante. Você escreveu dúzias de cartas que ela não respondeu, você deu flores que ela deixou a seco.
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Você gosta de rock e ela de chorinho, você gosta de praia e ela tem alergia a sol, você abomina Natal e ela detesta o Ano Novo, nem no ódio vocês combinam. Então?
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Então, que ela tem um jeito de sorrir que o deixa imobilizado, o beijo dela é mais viciante do que LSD, você adora brigar com ela e ela adora implicar com você. Isso tem nome.
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Você ama aquele cafajeste. Ele diz que vai e não liga, ele veste o primeiro trapo que encontra no armário. Ele não emplaca uma semana nos empregos, está sempre duro, e é meio galinha. Ele não tem a menor vocação para príncipe encantado e ainda assim você não consegue despachá-lo.
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Quando a mão dele toca na sua nuca, você derrete feito manteiga. Ele toca gaita na boca, adora animais e escreve poemas. Por que você ama este cara?
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Não pergunte pra mim você é inteligente. Lê livros, revistas, jornais. Gosta dos filmes dos irmãos Coen e do Robert Altman, mas sabe que uma boa comédia romântica também tem seu valor.
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É bonita. Seu cabelo nasceu para ser sacudido num comercial de xampu e seu corpo tem todas as curvas no lugar. Independente, emprego fixo, bom saldo no banco. Gosta de viajar, de música, tem loucura por computador e seu fettucine ao pesto é imbatível.
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Você tem bom humor, não pega no pé de ninguém e adora sexo. Com um currículo desse, criatura, por que está sem um amor?
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Ah, o amor, essa raposa. Quem dera o amor não fosse um sentimento, mas uma equação matemática: eu linda + você inteligente = dois apaixonados.
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Não funciona assim.
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Amar não requer conhecimento prévio nem consulta ao SPC. Ama-se justamente pelo que o Amor tem de indefinível.
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Honestos existem aos milhares, generosos têm às pencas, bons motoristas e bons pais de família, tá assim, ó!
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Mas ninguém consegue ser do jeito que o amor da sua vida é! Pense nisso. Pedir é a maneira mais eficaz de merecer. É a contingência maior de quem precisa.
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segunda-feira, 23 de junho de 2008

Corridinho - Adélia Prado



O amor quer abraçar e não pode.
A multidão em volta,
com seus olhos cediços,
põe caco de vidro no muro
para o amor desistir.
O amor usa o correio,
o correio trapaceia,
a carta não chega,
o amor fica sem saber se é ou não é.
O amor pega o cavalo,
desembarca do trem,
chega na porta cansado
de tanto caminhar a pé.
Fala a palavra açucena,
pede água, bebe café,
dorme na sua presença,
chupa bala de hortelã.
Tudo manha, truque, engenho:
é descuidar, o amor te pega,
te come, te molha todo.
Mas água o amor não é.
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domingo, 22 de junho de 2008

Ao Poente - Alphonsus de Guimaraens


Ficávamos sonhando horas inteiras,
com os olhos cheios de visões piedosas:
éramos duas virginais palmeiras,
abrindo ao céu as palmas silenciosas.
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As nossas almas, brancas, forasteiras,
no éter sublime alavam-se radiosas,
ao redor de nós dois, quantas roseiras...
O áureo poente coroava-nos de rosas.
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Era um arpejo de harpa todo o espaço;
mirava-a longamente, traço a traço,
no seu fulgor de arcanjo proibido.
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Surgia a lua, além, toda de cera ...
Ai como suave então me parecera
a voz do amor que eu nunca tinha ouvido.
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sexta-feira, 20 de junho de 2008

Se - Pablo Neruda


Se sou amado,

quanto mais amado

mais correspondo

ao amor.

Se sou esquecido,

devo esquecer também,

pois amor é feito espelho:

tem que ter reflexo!

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quinta-feira, 19 de junho de 2008

Argila - Raul de Leoni


Nascemos um para o outro, dessa argila
De que são feitas as criaturas raras;
Tens legendas pagãs nas carnes claras
E eu tenho a alma dos faunos na pupila...
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Às belezas heróicas te comparas
E em mim a luz olímpica cintila,
Gritam em nós todas as nobres taras
Daquela Grécia esplêndida e tranquila...
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É tanta a glória que nos encaminha
Em nosso amor de seleção, profundo,
Que (ouço ao longe o oráculo de Elêusis)
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Se um dia eu fosse teu e fosses minha,
O nosso amor conceberia um mundo
E do teu ventre nasceriam deuses...
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quarta-feira, 18 de junho de 2008

Memória - Carlos Drummond de Andrade


Amar o perdido
deixa confundido
este coração.
Nada pode o olvido
contra o sem sentido
apelo do Não.
As coisas tangíveis
tornam-se insensíveis
à palma da mão.
Mas as coisas findas,
muito mais que lindas,
essas ficarão.
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terça-feira, 17 de junho de 2008

Meus Rabiscos...


Apenas Você - Renata Christina Machado de Oliveira
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Apenas você tem o poder de me fazer flutuar
entre as estrelas do firmamento
e de me banhar no rio do seu olhar
tão profundo e misterioso
onde são guardados tesouros
que desvendam a arte de amar.
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quinta-feira, 12 de junho de 2008

Ter ou não ter Namorado - Arthur da Távola



Quem não tem namorado é alguém que tirou férias não remuneradas de si mesmo.
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Namorado é a mais difícil das conquistas.
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Difícil porque namorado de verdade é muito raro. Necessita de adivinhação, de pele, saliva,
lágrima, nuvem, quindim, brisa ou filosofia. Paquera, gabiru, flerte, caso, transa, envolvimento, até paixão, é fácil.
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Mas namorado, mesmo, é muito difícil. Namorado não precisa ser o mais bonito, mas ser aquele a quem se quer proteger e quando se chega ao lado dele a gente treme, sua frio e quase desmaia pedindo proteção. A proteção não precisa ser parruda, decidida; ou bandoleira basta um olhar de compreensão ou mesmo de aflição.
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Quem não tem namorado é quem não tem amor é quem não sabe o gosto de namorar. Há quem não sabe o gosto de namorar. Se você tem três pretendentes, dois paqueras, um envolvimento e dois amantes; mesmo assim pode não ter nenhum namorado.
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Não tem namorado quem não sabe o gosto de chuva, cinema sessão das duas, medo do pai, sanduíche de padaria ou drible no trabalho.
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Não tem namorado quem transa sem carinho, quem se acaricia sem vontade de virar sorvete ou lagartixa e quem ama sem alegria.
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Não tem namorado quem faz pacto de amor apenas com a infelicidade. Namorar é fazer pactos com a felicidade ainda que rápida, escondida, fugidia ou impossível de durar.
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Não tem namorado quem não sabe o valor de mãos dadas; de carinho escondido na hora em que passa o filme; de flor catada no muro e entregue de repente; de poesia de Fernando Pessoa, Vinícius de Moraes ou Chico Buarque lida bem devagar; de gargalhada quando fala junto ou descobre meia rasgada; de ânsia enorme de viajar junto para a Escócia ou mesmo de metrô, bonde, nuvem, cavalo alado, tapete mágico ou foguete interplanetário.
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Não tem namorado quem não gosta de dormir agarrado, de fazer cesta abraçado, fazer compra junto.
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Não tem namorado quem não gosta de falar do próprio amor, nem de ficar horas e horas olhando o mistério do outro dentro dos olhos dele, abobalhados de alegria pela lucidez do amor.
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Não tem namorado quem não redescobre a criança própria e a do amado e sai com ela para parques, fliperamas, beira - d'água, show do Milton Nascimento, bosques enluarados, ruas de sonhos ou musical da Metro.
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Não tem namorado quem não tem música secreta com ele, quem não dedica livros, quem não recorta artigos; quem gosta sem curtir; quem curte sem aprofundar.
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Não tem namorado quem nunca sentiu o gosto de ser lembrado de repente no fim de semana, na madrugada, ou meio-dia do dia de sol em plena praia cheia de rivais.
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Não tem namorado quem ama sem se dedicar; quem namora sem brincar; quem vive cheio de obrigações; quem faz sexo sem esperar o outro ir junto com ele.
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Não tem namorado quem confunde solidão com ficar sozinho e em paz.
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Não tem namorado quem não fala sozinho, não ri de si mesmo e quem tem medo de ser afetivo.
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Se você não tem namorado porque não descobriu que o amor é alegre e você vive pesando duzentos quilos de grilos e medos, ponha a saia mais leve, aquela de chita e passeie de mãos dadas com o ar. Enfeite-se com margaridas e ternuras e escove a alma com leves fricções de esperança. De alma escovada e coração estouvado, saia do quintal de si mesmo e descubra o próprio jardim.
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Acorde com gosto de caqui e sorria lírios para quem passe debaixo de sua janela. Ponha intenções de quermesse em seus olhos e beba licor de contos de fada. Ande como se o chão estivesse repleto de sons de flauta e do céu descesse uma névoa de borboletas, cada qual trazendo uma pérola falante a dizer frases sutis e palavras de galanteria.
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Se você não tem namorado é porque ainda não enlouqueceu aquele pouquinho necessário a fazer a vida parar e de repente parecer que faz sentido. ENLOU-CRESÇA.
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terça-feira, 10 de junho de 2008

Soneto XVII - William Shakespeare


Se te comparo a um dia de verão
És por certo mais belo e mais ameno
O vento espalha as folhas pelo chão
E o tempo do verão é bem pequeno.
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Ás vezes brilha o Sol em demasia
Outras vezes desmaia com frieza;
O que é belo declina num só dia,
Na terna mutação da natureza.
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Mas em ti o verão será eterno,
E a beleza que tens não perderás;
Nem chegarás da morte ao triste inverno:
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Nestas linhas com o tempo crescerás.
E enquanto nesta terra houver um ser,
Meus versos vivos te farão viver.
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segunda-feira, 9 de junho de 2008

Por Pablo Neruda


Plena mulher, maçã carnal, lua quente,
espesso aroma de algas, lodo e luz pisados,
que obscura claridade se abre entre tuas colunas?
que antiga noite o homem toca com seus sentidos?
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Ai, amar é uma viagem com água e com estrelas,
com ar opresso e bruscas tempestades de farinha:
amar é um combate de relâmpagos e dois corpos
por um só mel derrotados.
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Beijo a beijo percorro teu pequeno infinito,
tuas margens, teus rios, teus povoados pequenos,
e o fogo genital transformado em delícia
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corre pelos tênues caminhos do sangue
até precipitar-se como um cravo noturno,
até ser e não ser senão na sombra de um raio.
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domingo, 8 de junho de 2008

Limites do Amor - Affonso Romano de Sant'Anna


Condenado estou a te amar
nos meus limites
até que exausta e mais querendo
um amor total, livre das cercas,
Ate despeça de mim, sofrida,
na direção de outro amor
que pensas ser total e total será
nos seus limites da vida.
O amor não se mede
pela liberdade de se expor nas praças
e bares, em empecilho.
É claro que isto é bom e, às vezes,
sublime.
Mas se ama também de outra forma, incerta,
e este o mistério:
- ilimitado o amor às vezes se limita,
proibido é que o amor às vezes se liberta.
Ele quis morrer para arrasar a morte e voltar.
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quarta-feira, 4 de junho de 2008

Por Rubem Alves


“Sentimentos não podem ser prometidos porque não dependem da nossa vontade. Sua existência é efêmera. Como o vôo dos pássaros...”

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terça-feira, 3 de junho de 2008

Arte Final - Affonso Romano de Sant'Anna


Não basta um grande amor
para fazer poemas.
E o amor dos artistas, não se enganem,
não é mais belo
que o amor da gente.
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O grande amante é aquele que silente
se aplica a escrever com o corpo
o que seu corpo deseja e sente.
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Uma coisa é a letra,
e outra o ato,
- quem toma uma por outra
confunde e mente.
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segunda-feira, 2 de junho de 2008

O Teu Segredo - Florbela Espanca



O mundo diz-te alegre porque o riso
Desabrocha em tua boca, docemente
Como uma flor de luz! Meigo sorriso
Que na tua boca poisa alegremente!
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Chama-te o mundo alegre. Ai, meu amor,
Só eu inda li bem nessa alegria!…
Também parece alegre a triste cor
Do sol, à tarde, ao despedir-se o dia!…
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És triste; eu sei. Toda suavidade
Tão roxa, como é roxa uma saudade
É a tua alma, amor, cheia de mágoa.
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Eu sei que és triste, sei. O meu olhar
Descobriu o segredo, que a cantar
Repoisa nos teus olhos rasos d’água!…
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